segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Esporte de Luta

A jovem que desafiou o ‘nunca’

Superação: Atleta jundiaiense disputará o Campeonato Brasileiro de Caratê, em Manaus


André Kondo
Especial para o BOM DIA

“Você nunca mais poderá competir. Também não poderá treinar. Sinto muito, mas você tem que abandonar o caratê”. Este foi o duro diagnóstico do médico, ao examinar o lesionado joelho da jovem carateca Patrícia Barbosa do Nascimento. Quantas vezes na vida recebemos o duro golpe infligido pela palavra “nunca”?

Foi aos dez anos que a menina Patrícia, que na época treinava ginástica olímpica, voltou o seu olhar para os tatames do caratê. Nos intervalos da ginástica, passou a treinar a arte marcial do distante Japão, para surpresa dos próprios pais. No princípio, conciliou as duas modalidades esportivas, até que, por fim, a paixão pelo caratê falou mais alto. Foi a sua primeira paixão.

Quem vê o delicado rosto de Patrícia não pode imaginar a força que essa jovem tem. Força não apenas física, mas espiritual, a força que nos impele a superar os limites do corpo, as fronteiras do “nunca”.

Após uma série de vitórias defendendo a equipe de Jundiaí, Patrícia chegou ao tão sonhado Campeonato Brasileiro. Naquele ano, na final do Campeonato Paulista, Patrícia chegou a disputar o título com o joelho lesionado. Superou a dor e continuou lutando, até sagrar-se campeã paulista. Seu sonho estava para ser realizado.

Viajou para a cidade de Campo Grande (MS), em 2003. Lutou com todas as forças, mas acabou sendo derrotada pelos joelhos lesionados, que durante as semifinais não mais resistiram sustentar o peso de um sonho tão grande. Naquela época, ela ainda ostentava a faixa marrom, penúltimo passo para a tão almejada faixa preta. Um passo que foi interrompido. Após um duro golpe, seu joelho havia simplesmente saído do lugar, uma grave lesão. Nunca mais...

Patrícia passou a andar com dificuldade, submeteu-se a várias sessões de fisioterapia, mas o diagnóstico continuou o mesmo. Nunca mais poderia voltar a treinar caratê. Ao ingressar na Faculdade de Educação Física, decidiu aprofundar-se nos estudos de lesões semelhantes às suas. Montou um treinamento que, aos poucos, fortaleceu os músculos que passaram a sustentar os joelhos no lugar. Fazia exercícios de fortalecimento todos os dias. Enquanto isso, trabalhava para pagar os estudos com uma exaustiva carga horária, sempre sonhando em voltar a praticar caratê.

A convite do técnico Jefferson, da recém-formada equipe de Vinhedo, passou a treinar novamente, com a intenção de conquistar a faixa-preta. Sacrificou os finais de semana nos tatames, até que o inimaginável aconteceu. Em uma manhã, Patrícia vestiu o agasalho e partiu com a equipe vinhedense em 2009 para os Jogos Regionais em Atibaia. Estar de volta às competições já era uma vitória, porém, todo o esforço de Patrícia ainda seria recompensado com uma medalha de ouro em seu peito. A carateca estava de volta!

Ao final daquele mesmo ano, Patrícia conquistou a faixa preta... Seria este o fim de sua trajetória? Ainda não. “Eu só queria mais uma chance para ver até onde eu poderia chegar. Quando disputei o Brasileiro, não pude dar o meu melhor, pois meu joelho estava ruim. Meu sonho era poder competir mais uma vez... terminar o que eu havia começado”, diz Patrícia, com brilho nos olhos.

Aos poucos, Patrícia foi reconquistando seu espaço, ganhando medalhas até chegar a um passo de seu sonho. No ginásio do Ibirapuera, Patrícia disputaria as finais do Campeonato Paulista de Caratê de 2011. Se ganhasse uma medalha, competiria o Brasileiro. Porém, nada vem tão fácil assim. Em uma contestada decisão, Patrícia não ganhou. Seu treinador e seus colegas ficaram revoltados. No rosto de Patrícia, nenhuma reclamação: “Só pensei que teria que treinar mais”.

E ela treinou, com o prestigiado sensei Ivaldo da Silva, da Academia Nindokan, em São Paulo. Durante a semana, após o trabalho, pegava a moto e enfrentava o trânsito da capital paulista, até debaixo de chuva, para treinar. Passou a treinar também aos finais de semana, como convidada da Seleção Paulista (na verdade, auto-convidada, pois Patrícia não deveria estar ali, porque apenas os que integravam a seleção que disputaria o Brasileiro treinavam na Vila Olímpica). “Eu apenas pedi para treinar com eles, e a resposta foi sim”, revela Patrícia.

Foram vários treinos até o dia da seletiva que definiria a última vaga na seleção paulista. A chamada “quarta-vaga” é uma vaga importante e estratégica. Uma vaga difícil de se conquistar, pois não é definida por juízes em uma única competição, mas pelos treinadores, que conhecem a fundo os seus atletas. Uma única vaga.

E foi com lágrimas que Patrícia recebeu a notícia de que a sua passagem para o Campeonato Brasileiro, a ser disputado em Manaus, estava garantida. Quer dizer, quase. Em qualquer esporte, disputar uma competição sai muito caro. Por muitas vezes, por falta de recursos, como tantos outros atletas, Patrícia deixou de competir. Porém, tratava-se do campeonato de seus sonhos...

Ciente do esforço de Patrícia, a Perspectiva Saúde, empresa para a qual trabalha, decidiu patrociná-la. O dr. Sérgio Ferreira, um dos donos da companhia de Qualidade de Vida, orgulhosamente ofereceu patrocínio total como reconhecimento ao esforço de uma de suas mais valorosas colaboradoras. Patrícia viajará quinta-feira para disputar o Campeonato Brasileiro.

Independente de vencer o campeonato de seus sonhos, Patrícia já é uma vencedora, porque no caratê e na vida, não é o mais forte quem vence, mas aquele que melhor suporta os seus golpes. E essa jovem, com certeza, suportou.

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